terça-feira, 17 de outubro de 2017

Boa noite, Alice.

   Se agora não foi a hora de me curar, quando seria? Quantas pílulas deverei engolir ainda, todos os dias, para ter a sensação de que não permaneço em pedaços? Sempre um comprimido a mais... Uma luta diária para não tropeçar a lâmina da faca em mais uma cicatriz pelo corpo.
   Parece que muita coisa ficou para trás, que deixei escorrer muita história entre meus dedos. Alice cai eternamente pelo buraco e quando finalmente se depara com as portas, nenhuma delas é a certa. Nenhuma porta é do tamanho certo ou contém o mundo certo por trás. Quando Chapeuzinho Vermelho resolve pegar o atalho para a casa da vovozinha, ela sabia que se depararia com o lobo... mas e se ela não tivesse escolhido aquele trajeto, que outro lobo ela teria encontrado?
   Tudo acontece da maneira errada, mas sempre há quem salve... Será que isso é verdadeiro no mundo real? Alguém ainda pode me salvar? E se o meu herói for essa cápsula recheada de algo que mudará misteriosamente o meu humor? Será que para eu ser salva eu devo correr para longe de quem eu sou? Será mesmo que eu sou esse amontoado de ossos e lágrimas e insignificância?
   Depois que uma boneca de Dresden quebra, como consertar? Como esconder estas rachaduras tão toscas que acompanham minha retina, meu sorriso, meu rosto engolido por olheiras?
   E já que devo tomar estes remédios, por que não tomar alguns a mais e dormir o sono que eu tanto busco? Ser finalmente Alice e pular pelo buraco tão fundo...


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