domingo, 31 de agosto de 2014

Se cuida, k?

"Anjo". Ele ainda me chama assim. Talvez chame tantas outras, mas não quero saber das outras. Eu ainda sou a "anjo" dele e, assim, ele me mantém nele. E eu sou toda dele desde o dia que eu disse que era.
No trem, o caminho me afastava: a cada segundo, metros mais longe. Na garganta, mantinha preso um certo arrependimento da decisão que ele tomara. Sabe lá o que me esperaria? (...) Mas é ele! É ele quem eu quero, para quem eu sorrio com o animus verdadeiro e para quem (ainda) despejo meus esforços e preocupações. É esse homem de tez pálida, olhos indecisos e sorriso doce por quem guardo sonhos, ciúmes e até liberto algumas lágrimas.
Anjo também quer! E eu... Eu tudo isso, porque ainda sou tua "anjo" em algum canto da tua memória, no verbo expelido pela tua língua.

domingo, 24 de agosto de 2014

Relicário

O cenário era o clássico bar. E, apesar de eu não gostar de frequentar esses lugares públicos em finais de semana, fiz-me presente na sexta-feira. Sem ninguém conhecido por perto e embalada pela voz da moça do reggae, acendi a única companhia que eu poderia aceitar, talvez, naquele momento.
Enquanto o filtro vermelho queimava com pressa entre meus dedos, borbulharam lágrimas sem permissão. Eu estava sozinha, triste, envolta pelo sentimento de abandono... Mas eu estava em mim. Éramos eu e aquele reflexo de eu mesma que passei anos evitando ver. Eu e meus vícios.
Mas eu não queria... Eu não pude... Eu deveria mudar? Eu... O quê? Por que doía tanto? Por que era e depois deixou de ser? O que, em mim, estava errado? Onde estava minha (des)qualificação?

O cigarro terminou e começou a tocar aquela velha música... E eu cantei. Eu cantei tentando me desvencilhar de todos os nós que a garganta apertava.
Mergulhei nas memórias de todos os dias em que me vi em tua retina.

"O horizonte anuncia com o seu vitral que eu trocaria a eternidade por essa noite.
Por que está amanhecendo?
Peço o contrário: ver o sol se pôr!
Por que está amanhecendo?
Se não vou beijar seus lábios quando você se for."

(insiro aqui um vídeo particular:

Alice estava deitada na cama, olhando ele em pé. Ele estava em pé, olhando Alice deitada na cama. Ele disse: "tu estás ainda mais linda hoje do que no dia em que te conheci". Alice sorriu por dentro e por fora, e ele deitou ao lado dela para lhe dar um beijo, para lhe oferecer o peito como travesseiro.)

"O que está acontecendo?
O mundo está ao contrário e ninguém reparou.
O que está acontecendo?
Eu estava em paz quando você chegou."

E desde então, as palavras de Nando Reis ainda não perderam sua estampa da minha pele, mesmo com todos os banhos que eu tomei. A cada gota de tempo, venho descobrindo um preenchimento particular de agonia em algum ponto estranho do meu corpo. Eu simplesmente não entendo. O que está acontecendo?

sexta-feira, 8 de agosto de 2014

Escorre

Sobre as gotas de água que caíam em minha face, eu já não conseguia discernir se eram da chuva batendo delicada na janela, do chuveiro onde eu estava tomando banho, da sensação de acordar do desmaio, ou de tudo ao mesmo tempo. Quando dei-me por conta, as águas que escorriam corriam dos meus olhos em soluços.
Chorei tudo o que não chorara no último ano. Todas as dores que segurei e mantive no osso do peito acabaram por se soltar, uma a uma, e se arrastaram, rápidas e violentas, para o ralo. De repente, tive vergonha de ter me aberto para eu mesma e aceitado vomitar o que me entalava. A estranhez de situações modificáveis e repentinas...
De joelhos, nua, no chão molhado do banheiro, esvaziei minhas superficialidades. Segurava o ventre com força enquanto assistia o adeus em sangue de algo que nunca foi. A palidez das minhas coxas arderam como se a carne quisesse se abrir.
E, talvez, tenham mesmo se aberto e eu só não vi.