sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Esquadrilha da fumaça

(Dica: "Elephant Gun" - Beirut)
Expor um sentimento nem sempre é tão complicado quanto parece, ou quanto as pessoas tentam pintar. Corretamente, aceita-se o fato de que a língua falada não é capaz de reproduzir tudo o que de fato se deseja. É como querer traduzir a palavra "saudade" do português para o inglês, o francês, o grego...
Sentir é único e incomparável. Imensurável.
Quando uma criança recém-nascida chora, ela exprime o que está sentindo. E continuamos chorando até a morte - talvez não pelos mesmos motivos de outrora, mas assim é. Prosseguimos, com um aumento espetacular de esforços, na tentativa de explicar onde dói ou como é deleitosa determinada apreciação.

No momento em que tu me puxaste para perto do teu corpo, o Sol nos abraçava fortemente. Os aviões se cruzaram desenhando em fumaça a simbologia do que sentíamos: um coração. Ali, não havia nenhum "eu te gosto", "eu te adoro" ou "eu te amo" que necessitasse ser dito. Éramos dois pares de olhos a fitar o céu, o timbre quieto pelo palpitar do músculo desenhado no firmamento azul, projetado na nossa íris, na nossa memória;tua mão contorcia a minha. Uma fotografia imobilizada na (nossa) história, passível de tornar-se pública ou reclusa.

A oralidade deixa a desejar para a cinematografia; a cinematografia nunca vai promover a capacidade específica de sentir. Enquanto isso, teus dedos na minha pele, teu perfume adentrando minha roupa, o toque das tuas pupilas nos meus lábios... O silêncio mudo de anos sendo rasgado por outro silêncio, dessa vez, feliz.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Margaridas


A pele dela estava coberta de margaridas. Branca, branquinhas. Os caules faziam voltas em suas curvas. Sonhavam em se erguer, se dobrar, roçar na beleza do rosto. Ela era toda margaridas em um dia de sol, em um verde ermo, em meio a um céu sem nuvens. Colhi as flores do seu campo, seu corpo: uma a uma. Fiz um buquê. Virou atração em um vaso com água no meio da mesa da sala. Nunca murcharam.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

272km

Aqui, as janelas embaçadas escondem o céu cinza em uma única dimensão. O vento gélido a envolver o corpo, atravessando a pele e escorrendo pelo pescoço, seguindo o desenho da espinha. Esse sorriso bobo a possuir o brilho dos meus olhos - cinzas como a paisagem -, o caminho que leva meus pés até o verde robusto do teu jardim perfumado.
Aí, onde estás, sei que chove. Gotas gordas, felizes, a escorrerem pelos teus braços. O calor a desprender na neblina do horizonte. A alpargata batendo no assoalho: "are you gonna be my girl?"

Aqui, não chove. Mas estou indo ao teu encontro: quero me molhar.