segunda-feira, 15 de abril de 2019

Luto por Notre Dame

   Hoje uma parte de mim morre. Uma parte de mim está em chamas. Tudo aquilo que eu mais amei, tudo aquilo que guardo com tanto apreço antes, tudo queima em altas labaredas, quentes, irreparáveis.
   Esmeralda abraça Quasímodo e ambos choram. Perderam o lar e a alma. A essência e a história.
   Hoje, uma parte da minha infância se foi e a agonia não reconstrói a dor de ferida aberta que sinto. Olho para minhas mãos, para dentro dos meus olhos no espelho, e nada posso fazer. Estou longe demais, sou impotente demais. O que a água engoliu no Rio, não supera a pira.
   Eu daria a minha vida por esta catedral, apenas para que tudo voltasse a ser como sempre foi. Para resguardar a magia eterna das escadarias, vitrais e ares de Notre Dame de Paris.


quinta-feira, 11 de abril de 2019

O avião

   Tudo o que eu queria era voltar 25 anos atrás e reviver tudo de novo. Emperrar em 1997 e nunca pegar aquele avião.
   Aquele avião estragou a minha vida. Cindiu minha infância em duas e me fez amadurecer mais rápido, não sendo necessariamente a melhor coisa para mim. Não para aquela época.
   Mal tinha entendido que os dentes caem e já tinha que ter um time de futebol, entender que dançar o tchan era vulgar, que saber cozinhar era necessário para alimentar uma mãe acamada por tempo até demais, trocar fraldas de uma criança que não era minha,... Tudo depois daquele avião foi o inferno pra mim. Ninguém me perguntou como eu me sentia e nunca perguntaram, na realidade.
   A sexualidade mal resolvida, os amigos deixados para trás, uma intensidade que só eu carrego e ninguém - nem os que ficaram, nem os que vieram - entendem.
   O avião decolou e eu nem pude chorar, porque me proibiram. Eu era proibida de sentir.
   E agora, 25 anos depois, sigo pegando vários aviões sem nunca chegar no lugar certo, porque o lugar certo é 1993 e a primeira língua, a verdadeira cultura, o ar de verdade para mim... Nunca mais vai ser 1993. Eu nunca vou poder ser o que eu gostaria. Nunca vou poder viver o que eu gostaria. O tempo já passou. E continuo deixando passar. O tempo passa e eu aqui. Trancada em um avião, engolindo o choro, em 1997.