quarta-feira, 12 de agosto de 2020

Espírito

   Toda vez que falo com Gael é uma lágrima minha que escorre.

   Não que seja de tristeza, mas é por reconhecer que há alguém que me conhece e se importa. É entender que anjos existem e que, nesse momento, só as asas negras e plumosas de Gael podem me ajudar, mesmo que tais asas sejam apenas algumas palavras do outro lado da tela.

   Ele me conhece e me entende e eu não me conheço e não me entendo.

   Toda essa luta diária entre o céu e o inferno dentro de mim... "A vida está boa", eu digo. "As coisas por aí não estão fáceis", ele traduz. 

   Mas, Gael, essa sensação de pessoa descartável que eu sinto que sou, não tem o que faça mudar. Entende que talvez, tudo o que eu tenha feito, seja para me sentir um minuto especial. Mesmo não sendo. Mesmo ninguém reconhecendo. Sim, Gael, eu sei que tu reconheces, mas cada sopro é diferente de cada grito e a minha loucura não tem cura mais.

   Um pouco mais e eu vou estar desistindo de mim, ó, anjo, e peço perdão antecipado por não poder te visitar. Eu me transformei nesse bicho asqueroso que nem as memórias recuperam o espírito. E o que sobra de mim sangra e arde e dói e sofre e segue...