domingo, 27 de fevereiro de 2011

Between the bars

As papilas gustativas trouxeram à minha memória todas as histórias vividas no escuro daquele lugar que adotei como "lar". Éramos três e nos amávamos igualmente e de formas diferentes. Igualmente e numa intensidade extrema, capaz de marcar cicatrizes que nunca desaparecerão da carne e do cerne.
O sorriso nunca foi tão sincero. O sono não marcava presença. Éramos felizes em nossa imensidão de sentimentos atordoados. Éramos especiais como nunca mais seremos. Os cuidados, aflitos e sedentos, sempre transbordaram daquela cama para o céu negro e iluminado pela pálida luz da lua.
Hoje, ao querer tentar esse sorriso, faltam as verdadeiras alegrias... as lágrimas grossas tornaram-se as melhores companheiras. As coisas simples perderam efeito: o vinho virou água, a noite traz o sono outrora inexistente, as dores recomeçam a arder. Apenas as músicas mantêm o sentido de cada momento, cada carinho...
A vida mostrou-se como deve ser vivida e debochou dos que nunca sentiram tamanho prazer nas linhas de cada boca. Dentre nós, ninguém mais é como era.

sábado, 26 de fevereiro de 2011

"Suicides"

"Depuis quelques années déjà un phénomène se passe en moi. Tous les événements de l'existence qui, autrefois, resplendissaient à mes yeux comme des aurores, me semblent se décolorer. La signification des choses m'est apparue dans sa réalité brutale; et la raison vraie de l'amour m'a dégoûté même des poétiques tendresses.
Nous sommes les jouets éternels d'illusions stupides et charmantes toujours renouvelées.
(...)
Chaque cerveau est comme un cirque, où tourne éternellement un pauvre cheval enfermé. Quels que soient nos efforts, nos détours, nos crochets, la limite est proche et arrondie d'une façon continue, sans saillies imprévues et sans porte sur l'inconnu. Il faut tourner, tourner toujours, par les mêmes idées, les mêmes joies, les mêmes plaisanteries, les mêmes habitudes, les mêmes croyances, les mêmes écoeurements.
(...)
Je cherchai ce que je pourrais fair pour échapper à moi-même. Toute occupation m'épouvanta comme plus odieuse encore que l'inaction.
(...)
Oui, oui, les morts reviennent, car je l'ai vu. Notre mémoire est un monde plus parfait que l'univers: elle rend la vie à ce qui n'existe plus!"

(GUY DE MAUPASSANT)

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Senti saudade de quando eu gostava do banho de mar; do sol que queimou meu rosto; das lágrimas despejadas por antecedência.. o medo de partir. Senti vontade daquele abraço apertado, das noites que cuidei do teu sono inquieto, daquele chimarrão amargo na frente da casa enquanto anoitecia...
Saudade? Saudade vem e vai e vem e vai e vem e  vai e vem e vai e vem e vai ........
e vai..........
e vai......... até que a gente se acostuma. Congela. Finge que deixou de sentir.

E foi.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Vaga-Lume

A noite, com seu hálito quente de verão, envolveu completamente o meu corpo e fez da minha íris, espelho das estrelas brilhantes. Do verde da grama, surgem em animada coreografia, dois vaga-lumes, trançando harmoniosamente a paz por entre o sereno. Delicadamente, o contraste daquele brilho com a escuridão pousa em uma das minhas coxas. Piscavam, na intrigância do meu ser, os nebulosos pensamentos de felicidade constante - assim como aquela luz límpida - que se erguem além das nuvens escondidas e repousam nos olhos daquele homem de futuro tão incerto quanto os primeiros passos de criança.
Contemplei a brisa suave, deslizante pelo meu colo, arrepiando tal qual dedos carinhosos sem rumo pela espinha. A Lua brilha mais que o Sol.. e me ama, e não me machuca.. As anemias, confundidas entre minha pele e aquele desfrutar de sonhos, foram engolidas pelo intenso olhar que nunca vi.
Por enquanto, deixo-me contentar inteiramente com o sorrir inexistente dos vaga-lumes.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

This place was never the same again after you came and went

Abruptamente, aquela música tão esquecida, voltou a mexer sensações com meus tímpanos. Sem perceber, já havia me transportado para aquele quarto de horas tão lindas que passamos juntas.
Era o meu riso que dava as mãos às gargalhadas que aquela mulher deixava escapar, relativas às suas - nada úteis - tentativas de fuga dos malabarismos das minhas mãos. As cócegas deixavam-na radiante! Nesse momento, já não éramos duas irmãs, nem duas amantes.. éramos crianças, brincando de viver os últimos momentos - que não admitíamos chegar - da convivência mais nobre e digna que oferecemos uma para a outra e aceitamos merecidamente.

"Look to the past and remember and smile
And maybe tonight I can breathe for a while
I'm not in the seat I think I'm falling asleep
But then all that it needs is I'll always be dreaming of you"

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

28/01/2007

Escuto o proclamar das tuas juras
Secretas ou indiscretas
Satânicas ou divinas, nuas ou puras..
Revivendo cada vírgula da tua respiração,
Sussurrando o tempo, a razão, o vento...
Despida de argumentos, vejo meus olhos mortos
E a malícia do sorriso
E as marcas de agressividade nos carinhos.


Se quiseres descobrir a vampira dos desejos
Não te esforças! Não me procures!
Estou carne e alma reproduzida no teu sono,
(Cujo trilar dos grilos darão motivos para ti sonhar

sendo sinal, apenas, da caça e do lobo...)
Onde todo o desespero resume-se ao verbo:
AMAR.

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

As mulheres francesas

É como se eu estivesse patamares abaixo do que este lugar representa. É tudo como era, mas eu não sou mais como eu deveria ser para estar aqui. Eu, pobre criatura, desejando cada uma delas ao mesmo tempo que passo a desejar ser todas elas.
São todas iguais: o jeito de andar - passo firme, coluna reta e queixo erguido-, magras, exibindo a todos, o charme de serem mulheres francesas. Cada fio de cabelo fora do lugar ainda é o lugar certo que estes devem se encontrar. Elas são sensuais, sérias, ríspidas, estilosas, tensamente lindas. Lindas, misteriosas e fúteis.
Mulheres assim são merecedoras de rosas bem embrulhadas, como estas que o menino leva contente em suas mãos magras e geladas. Meninos na idade deste, têm os olhos vazados por sonhos e dependem das mademoiselles para poderem tentar enxergar a neve que começa a cair lá fora.

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Olhos verdes e risadas sinceras. Histórias e mais histórias caindo nuas e inteiras sobre mim. A atenção nunca teve um trabalho tão importante. O sorriso, indeciso por aparecer, se abriu como as flores na primavera. A menina, que também é mulher, abraçou o momento como quem aceita a predestinação de qualquer possível futura dor. É um novo já antigo, descobertas já conhecidas, o jogo favorito.
As paredes brancas de teu quarto contrastam com o cinza do meu céu... Enquanto isso, uma lagartixa passeia por cima do colchão...

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Probabilidades

Creio que a recompensa do amor
É o sofrimento
Sei que o sinônimo de dor
É o desalento
Quero acreditar na possessão do seu eu
(Não ser como as outras...)
E não conhecer o poder do adeus
Ao menos, não dos lábios teus..

Palavras loucas.
(13.abr.2006)

domingo, 6 de fevereiro de 2011

L'invitation au voyage

"Des rêves! toujours des rêves! et plus l'âme est ambitieuse et délicate, plus les rêves l'éloignent du possible. Chaque homme porte en lui sa dose d'opium naturel, incessamment sécrétée et renouvelée, et, de la naissance à la mort, combien comptons-nous d'heures remplies par la jouissance positive, par l'action réussie et décidée? Vivrons-nous jamais, passerons-nous jamais dans ce tableau qu'a peint mon esprit, ce tableau qui te ressemble?
Ces trésors, ces meubles, ce luxe, cet ordre, ces parfums, ces fleurs miraculeuses, c'est toi. C'est encore toi, ces grands fleuves et ces canaux tranquilles. Ces énormes navires qu'ils charrient, tout chargés de richesses, et d'où montent les chants monotones de la manoeuvre, ce sont mes pensées qui dorment ou qui roulent sur ton sein. Tu les conduis doucement vers la mer qui est l'Infini, tout en réfléchissant les profondeurs du ciel dans la limpidité de ta belle âme; -et quand, fatigués par la houle et gorgés de produits de l'Orient, ils rentrent au port natal, ce sont encore mes pensées enrichies qui reviennent de l'Infini vers toi."
BAUDELAIRE, Charles. "Le Spleen de Paris - petits poèmes en prose"; Librio, Paris, 2002.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Marina.

Quis ficar uma hora a mais, mas não me autorizaram. Tiraram-me do lugar mais familiar que me encontrei desde que cheguei. É aqui que quero ficar, que pertence o meu eu.
Ver essa menina, depois de treze anos, tão perto de mim, olhando dentro do meu olho, tentando decifrar as chagas que carreguei e que carrego..., trabalhou com tantos sentimentos quanto os possíveis e existentes. E essa menina que conhecia todos os meus segredos quis saber da minha vida em que ela esteve ausente, mas não tive como - e nem sabia por onde - começar.
O "até logo" me trouxe uma dor enorme na alma. O último "até logo" durara tanto tempo para se consolidar... Quem sabe, da próxima vez que eu vier, seja para ficar e não mais largar o que sei que é nada além que minha identidade, minha felicidade, o meu ser no lugar certo.
(27/dez/2010)

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Certamente têm nuvens que, caso eu decidisse deixar amparar meu corpo, me fariam quicar e voltar, assim como criança pulando em cama elástica, ou eu, apreciando a cama dela. Há uma magia rupestre nas coisas que nos incitam a analisar a vida sob a visão de crianças despreocupadas.
A janela tem resquícios do que se passou de madrugada em meio a tantas turbulências e falta de sono. Pontos de congelamento simulando o desenho de um grande floco de neve. Por trás, várias aglomerações urbanas distribuídas no meio daquela imensidão verde da campanha. A França, que me esperou por tanto tempo voltar, já me tem. Se ela está feliz com isso ou não, decide-se em outro momento.
E nado novamente por entre os flocos de algodão doce, tão brancos quanto as nuvens dos meus sonhos.
(02/dez/2010)

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Soneto Fúnebre

Realizei, finalmente, meu cemitério
Lugar onde enterrei este lúcido corpo
De onde não saíra mais nenhum outro morto
Leito gloriosamente frio e solitário.

Dessa solidão, deposito em meu arredor
Tantas dores, lágrimas e, ainda, confusões.
Aqui, deitei para findar certas ações
E fingir que nunca matei meu único amor.

Realizei meu cemitério, finalmente!
Basta procurar a palidez com veias
No deserto onde a neve é tecida em teias!

Tornei-me feia aos teus olhos, creio tristemente...
Perdi a vida, coagulou o sangue, terminou o ar...
Agora que estou morta, vens me visitar?