quarta-feira, 3 de maio de 2017

Eu.

   Se as coisas fossem tão simples quanto tomar um banho para retirar a sujeira do corpo, eu não estaria aqui, chorando minha impotência de ser como sou. Cada gota que pinga e escorre traz à flor da pele todas as existências que eu não quis.
    É irritantemente repetitivo e desgastante a vontade de abrir os olhos. Esse eterno sentir machucado. Têm vezes que respirar dói e que levantar da cama torna-se impossível. Minha pele esculpe cicatrizes todas as vezes que minha cabeça sufoca. Pensar dói. Relembrar arde. Sangra. Impotência.
   Sentir é relativo, dizem. Cada um sente a dor de alguma forma e lida com ela assim. As pessoas dizem que sou forte. Eu me sinto fraca. Acho que ninguém entende... Ninguém nunca vai entender.
   Todas as noites os olhos fecham e aquele velho filme de horrores transpassa pela minha retina. O grito sufoca. Jamais vão curar. As cicatrizes. Jamais vão. Até quando?



   Por que eu tenho que viver essa vida?

2 comentários:

  1. De todas as coisas que eram e que não
    De todos os cortes a fogo e facão
    De tantas mentiras e apertos de mão
    De sobras de sonhos sem pé e sem chão.

    Se somos só carne e só alma - em vão
    Ou se somos poeira ao vento - oração
    Nosso sangue dilui o delírio - ilusão
    Dentre todas as coisas que eram e que não.

    Ainda lembro da noite de raio e trovão
    Do teu corpo brilhando suado no chão
    Do teu rosto de anjo na luz do clarão
    Do demônio em teus olhos de mar - tentação.

    A loucura me sangra de raiva - tesão
    A saudade no escuro rugindo - leão
    Dentre todas as coisas que eram e que não
    Teu gozo é convite pra beijo - lambida - arranhão.

    De todo o passado que eu lamberia igual cão
    De reminiscências - piano - francês - violão
    Teu trono aqui dentro tão forte no meu coração
    A Petite ainda dorme em tons de segredo e violação.


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