sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

Doer.

Escondida atrás da porta da cozinha, ela chorava. Silenciosa. Sentia que o sofrimento que carregava era incômodo aos demais. Não queria ser incômodo: queria apenas parar de doer!
A inércia das palavras presas na sua cabeça – mas que se negavam a sair para o mundo além dos seus lábios – lhe deixava aflita. Haviam anotações dos remorsos e angústias espalhados pela casa, em bilhetes rasgados, que só ela conseguia ver.

Como conjuga-se o verbo “doer” na primeira pessoa do singular do presente? Eu doo? Eu doo de doar? Doar dói?

Todas as visitas sensibilizadas pela palidez da pele, pela falta de brilho dos olhos verdes caídos. A família a perguntar da transparente saúde debilitada. E aquele sorriso amarelo surgindo forte, com a mesma frequência dos comentários desnecessários, murmurando um pobre “está tudo bem” - como se ouvindo sua voz em mentira, viesse a soar uma grande verdade.
Se não está tudo bem, mocinha, por que insistir que está? Por que insistir na dor, mocinha?


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