quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Monocromo

   A pílula é branca. O sabor é doce. Macia ao mastigar. Não machuca ao engolir. Não traz ressaca ao amanhecer. Não me faz adormecer... Um comprimido de emoções que me regula: um mar sem ondas.
   A sensação é de que nada acontece. Nada nunca aconteceu. Ser normal não me faz feliz. Mas também não me faz triste. A monotonia do monocromático. Ou preto, ou branco. Sem cores. Sem escalas de cinza. Ou branco, ou preto.
   A pílula não me agrada. Nunca agradou. É solução, não desejo. Deveria ter sido há mais tempo. Queria não precisar há tanto tempo quanto...
   O sono não vem. Os pensamentos tampouco. A mente limpa, vazia, sem dores. A mente limpa, vazia, sem de fato sentir. A paixão, a fúria, as lágrimas, as gargalhadas... Tudo em uma única expressão: superficial, frívola, insignificante.
   A pílula. Muitos pontos. Muitos silêncios. Nem tantos sorrisos. Nem tanto brilho nos olhos. A mão que treme. A dicotomia de querer sentir e não querer. Sentir. A dor que não vem. A espera agonizante de algo que nunca mais. Aquele algo que não sei bem o quê. Uma agonia diferente: não mais do que pode ou não acontecer, mas de uma insatisfação por entender que ser normal, sem intensidade, sem ser triste ou feliz, não tem graça nenhuma.
   Sinto falta das minhas oscilações. Ninguém mais sente.


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