sábado, 24 de março de 2018

A volta de Gael

   Fazia tempo que Gael não se mostrava para Alice. Asas brancas e toda a pureza que uma alma bondosa carrega. Gael decidiu aparecer em sonhos e mostrar à menina a podridão do mundo, os males da carne, as dores que adormecem e pinicam a pele. A sujeira que não sai. Ele apareceu, mostrou, sorriu e desapareceu.
   Alice, sem nada compreender, ficou procurando o buraco para cair, mas já não o encontra. Não são mais apenas os sonhos. Piscar machuca a íris e as pálpebras carregam muito mais lágrimas do que conseguem suportar para se manterem erguidas.
   Acontece que a ingenuidade de Gael não conhece o mundo da mesma forma que Alice conhece. Cada um sofre da maneira que consegue pelos motivos que cada alma mantém. Um dia, talvez, Gael irá embora para sempre e Alice estará caindo constantemente no buraco que a levará ao país das maravilhas. Sem volta. Os sonhos irão se mesclar à realidade e tudo arderá muito mais.
   Ninguém nunca disse que ser anjo era bom. Ninguém nunca explicou que ser humano corrói. Ninguém jamais irá costurar a carne rasgada e limpar o pus que brota fétido da ferida do passado.


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