O aroma de café na
memória me fez levantar. E quando vi ele e ela deitados, percebi
que, mesmo jamais tendo sido três, era o que eu deveria fazer. Ao
aquecer a água, já sabia que nada adoçaria melhor aquele momento
do que o sono profundo deles e que o café deveria ser amargo mesmo,
para fazer sorrir o bom dia.
Fiquei deitada muito
tempo sem querer estar. Dormir tem sido algo tão difícil e me
dói... Não exatamente por ter algo que me incomode, mas eu
simplesmente já não consigo mais. Ou não vejo mais razão. Tanta
coisa pra fazer, pra correr atrás, o horário que não dá nunca mais
para perder...
Se bem que, só pelo
fato de negar várias supostas preocupações, elas já existem e
estão ali, em mim. Muita chuva deve chover de verdade – sem ser só
o barulho reproduzido em caixas de som. Talvez seja essa espera, que
chova logo, para que eu possa abrir arco-íris em meu ventre, assim
como ele abre em si, toda vez que sorri para mim.
Era escuro, e mesmo de
olhos fechados, eu sabia que lá estavam, brilhantes e castanhos, os
olhos dele repousando na minha tez. Senti minha palidez fazendo-se
rubra enquanto aguardava os sonhos que nunca vieram. Aqueles sonhos
ruins que fizeram Beatrice estremecer há tantos anos...
Entendi hoje que deixei
de ser Alice. Acabaram-se as ondas no cabelo e o mar dos olhos.
Ninguém pode se esconder atrás de uma máscara eternamente. Ou
melhor, provavelmente possa, mas não deveria. E eu não devo também! Eu não sou mais Alice, embora siga sendo uma menina de riso fácil e
dores escondidas. Assim como todos. Todos temos essas águas que não
derramam em cachoeira. E essas águas tantas, eu arranquei da minha
retina e do meu verbo. O verbo faz-se luz.
Olhando as paredes
brancas, o café escuro entrou na xícara. E, em valsa, percebi que
sou mais leve que uma pluma, de repente. “Não mais que de
repente”.